“O planeta Terra está virando um lixão. O remédio está nas bactérias, nos fungos, nas bufas-do-cão”
Otávio Sitônio Pinto*
Tempo desses descobriram na Amazônia uma bactéria que come plástico. Trata-se da pestalotiopsis microspora. O retrato na Internet revela uma bela bactéria, mas tem jeito de fungo. Parece com os cogumelos que chamávamos, quando meninos, de bufa-do-cão. Atribuía-se um bocado de ruindades às bufas-do-cão: matavam, pois eram venenosos. Medravam no lixo, nos troncos em decomposição de árvores mortas. Evitávamos o contato com as ditas bufas. Sempre achei que elas tinham um jeito suspeito. Quem devorou meus brinquedos de plástico? Será que foram as bufas-do-cão? Eu não sabia que meus brinquedos eram poluentes, naquele tempo nem havia poluição.
Quem está devorando o poliuretano? Um fungo ou uma bactéria?
Os cogumelos são fungos, bem maiores que as bactérias, que são microscópicas. A Net muitas vezes publica informações equivocadas. A bactéria – doravante microspora, pois é mais fácil de dizer e escrever – foi descoberta por estudantes da Universidade de Yale, na Amazônia equatoriana. Eis duas notícias boas numa só manchete. Uma, da bactéria que devora um dos plásticos mais resistentes: o poliuretano; outra, que foi descoberta por estudantes. Há muitos estudantes no mundo, e eles podem descobrir outras coisas úteis à vida. Que a descoberta da turma de Yale sirva de estímulo aos estudantes do mundo. Uni-vos.
Seja lá quem for que rói o poliuretano, fungo ou bactéria, seja bem vindo. O poliuretano não deve ser queimado, pois sua fumaça vai poluir ainda mais a atmosfera. A microspora é uma esperança de salvação para os lixões, presentes em quase todas as cidades, e os oceanos. Ambos, lixões e oceanos, estão ameaçados pela avalanche de lixo que o bicho homem produz. Haja bactérias, haja fungos para comer o sobejo do homem. Quem será mais rápido? O homem ou a bactéria?
Uma das vantagens da microspora é que ela é anaeróbica, o que lhe possibilita viver sem o oxigênio de todos nós. Assim, ela pode atuar nas camadas inferiores dos depósitos de lixo, comendo o poliuretano por baixo, como o velho fogo de monturo – e sem fazer fumaça. Há bactérias assim, que podem sobreviver sem o popular oxigênio. Tem uma que está comendo a sucata do Titanic, debaixo do mar. Trata-se da halomonas titanicae. Destino muito triste o do Titanic. Depois da tragédia do naufrágio, está sendo devorado por uma bactéria. Será que as halomonas estão devorando também os navios afundados em Pearl Harbor? E os mercantes brasileiros torpedeados nas duas guerras mundiais?
Ainda bem que existem as halomonas e as microsporas para comerem o resíduo histórico do bicho humano. Elas vão salvar os sete mares, os milhares de lixões do mundo. Só no Brasil se recolhe mais de 125 mil toneladas de lixo domiciliar por dia. Parte dessa imundície vira chorume – aquele caldo preto que escorre do lixo acumulado. O chorume se infiltra no solo e vai dar no lençol freático, poluindo as reservas aquíferas. A burguesia que bebe água de poços subterrâneos não sabe que está degustando chorume. Nas cidades em que não há tratamento de esgoto, o chorume recebe o reforço do líquido das fossas domésticas – que também escorre até o freático. E vai parar nas geladeiras domésticas. Não adianta comprar água mineral: ela também é atingida pela poluição que vai bater nas profundas.
O planeta Terra está virando um lixão. O remédio está nas bactérias, nos fungos, nas bufas-do-cão. Procura-se bactérias, precisa-se de bactérias que devorem lixo. Precisa-se de estudantes para procurar bactérias na floresta amazônica, nas profundezas do mar, onde repousa o Titanic, amém.
*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras e da Academia de Letras e Artes do Nordeste.