“A bola caiu no pé do ponta, não me lembro mais quem era. Não foi gol, mas a torcida se levantou e aplaudiu o passe”
Otávio Sitônio
Enquanto começa o jogo Brasil Argentina fico me lembrando de quando antigamente ouvíamos a partida pelo rádio. As Copas de 58 e de 62 foram assim. E o som chegava chiando, com muita interferência. Era preciso apurar o ouvido para se ter uma noção dos dribles de Garrincha naquele jogo do Brasil Rússia. Garrincha driblou a defesa russa durante três minutos fantásticos, mandou bola na trave, tudo. No jogo contra a Suécia foi a mesma coisa.
O rádio transmitia uma emoção que a TV não faz. Por isso o teatrólogo Antônio Serafim prefere acompanhar o jogo pelo rádio. Não sei se ele ainda faz, mas fazia assim, mesmo depois da televisão ter chegado. E havia torcedores que iam a campo e levavam o rádio, como se não acreditassem no que os olhos vissem e precisassem conferir com o ouvido. Nunca mais fui a campo e não sei como são os costumes de hoje.
Até um tempo desses a barbárie urinava nas latas de cerveja e atirava para ver na cabeça de quem ia pegar. A barbárie continua se matando nas arquibancadas, desesperada porque não está jogando, resta gritar e brigar. Por que as torcidas não se organizam para ver o jogo pela TV, numa tela bem grande? Ver o replay, rever o pênalti que não houve, o jogador cavando a falta, o zoom mostrando o detalhe? No campo não se vê essas coisas.
Assisti ao jogo Brasil Argentina no Beira Rio de Porto Alegre. Faz muito tempo, foi antigamente, no começo dos anos setentas. Quase meio século. No campo, a gente adivinha quem é o jogador que está com a bola pela posição e o jeitão, mas não distingue sua cara. Gérson, por exemplo, estava sempre pelo meio campo com sua postura emborcada, corcunda. Não se sabia como o camisa oito via o jogo para fazer seus passes certeiros, pois olhava para baixo.
Gérson fez uma inversão do jogo, chutando lá da intermediária direita brasileira para a intermediária da ponta esquerda, numa distância de 50 metros. A bola caiu no pé do ponta, não me lembro mais quem era. Não foi gol, mas a torcida se levantou e aplaudiu o passe. Depois a Argentina fez o primeiro, o Brasil não empatou e os gaúchos começaram a gritar mais um, mais um, até que os argentinos fizeram mais um e a Seleção Brasileira amargou uma vaia. Gérson se danou.
Faz tempo que defendo a construção de um estádio no meio do caminho para Campina. Ele serviria a duas dezenas de cidades: Itabaiana, Salgado de São Félix, Umbuzeiro, Natuba, Aroeiras, Alagoa Nova, Alagoa Grande, Caldas Brandão, Ingá, Riachão, Campina, Sapé, Mari, Guarabira, Pilões, Areia, Santa Rita, Bayeux, a Capital, até Pernambuco – São Vicente Ferrer, Orobó, mais as que esqueci. O meio do caminho entre esses lugares não passa de 60 km. Antigamente se ia de trem para Itabaiana, que fica à beira do caminho.
Aquele lugar é estratégico. Um hospital ali serviria a muitas localidades. Assim também uma universidade, bem na emenda do Agreste com a Caatinga, perto do Brejo. Eu já escrevi várias vezes sobre esse assunto, faz tempo que abordo o tema. Mas os gestores não leem minhas mal traçadas, só quando falo mal deles. Dizia Ariano, o Grande, que é muita falta de educação falar mal das pessoas pela frente. Eu não falo mal nem pela frente nem por trás, falo de banda. Mas tem gente que tem uma banda mouca, e não escuta nem quando se grita.
Agora mesmo estou gritando: façam um estádio, um hospital, uma universidade no meio do caminho para Campina, na entrada para Itabaiana. Vai servir a meia Paraíba, até Pernambuco e o Rio Grande. E puxem a linha do trem até lá, falta pouco para o trem chegar lá. O jogo vai começar. Brasil Argentina. O clássico das Américas. Mas nenhuma emissora está transmitindo. Antigamente era melhor, havia o rádio de Serafim.
*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras e da Academia de Letras e Artes do Nordeste.