“O nosso Zorba era mesmo um filósofo da câmara: andava fotografando vivos e mortos”
Otávio Stiônio
Tempos atrás vi uma foto na banca de revistas Viña del Mar. Era o retrato de um depósito de troços e bagulhos. Em primeiro plano, um amontoado de cadeiras de pernas para o ar; ao fundo,o uma ceia larga tomado quase todo o ambiente. Simplesmente insólita. A foto tinha ganhado um concurso no Rio de Janeiro. À primeira vista, ocorreu-me a certeza de que a fotografia era de Antônio Augusto Fontes, o Zorba, artista de prêmios internacionais e nacionais, pois santo de casa também faz milagres.
Antonio Augusto fotografou celebridades, como Chico Buarque (esse você conhece) para a capa de seu disco Chico Buarque, LP E CD. Em 1984 ganhou o prêmio Eugene Atget, numa promoção da Air France, da Prefeitura de Paris e Paris Audiovisuel. Em 1991, ganhou o prêmio Marc Ferrez de Fotografia, para desenvolver o ensaio “Rio de Janeiro: um olhar cego sobre a cidade”, e a Bolsa Vitae de Arte.
Zorba trabalhou para Isto É, Veja e Exame. Foi é consultor técnico do Arquivo Fotográfico do Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas. Fez trabalhos de free-lancer para diversos veículos nacionais, como o jornal Estado de São Paulo, para quem fotografou o Raso da Catarina, na Bahia. Ele já fotografara o Raso outras vezes, inclusive para a revista Good Year, numa reportagem com Claudio Bojunga.
Desse trabalho eu fui testemunha ocular, pois acompanhei Zorba durante os cinco dias que passamos no Raso, seguindo as pegadas dos cangaceiros homiziados nas caatingas dos índios Pankararés – aventura que está registrada no meu livro “Dom Sertão, Dona Seca”, também premiado e esgotado. Guiados pelo índio Antônio, saímos meio vivos do raso, onde enfartei, mas consegui dirigir o jipe até bater o motor em Alagoas e fazer o resto da viagem de táxi. E voltar para trazer o jipe num caminhão reboque.
O enfarte foi diagnosticado três dias depois. Não morri no Raso, não morrerei mais nunca, como você está vendo.
Antonio Augusto aperfeiçoou-se como fotógrafo no New York Institute of Photographie. Estudou Antropologia e História da Arte no Manchester College. Mas abandonou o curso de engenharia mecânica no último ano. Não insista, não há quem o convença a voltar. Depois, fez sua sede no Rio de Janeiro, onde mora com Alba Maria Peregrino Fontes(Basinha), a professora de flauta, e onde teve três filhos: Catarina, Beatriz e André, pela ordem de entrada.
O nome de Zorba ele ganhou por conta de seu perfil de filósofo, ao tempo em era exibido o filme “Zorba, o Grego”. Mas a maledicência fala também numa namorada grega, que frequentou sua adolescência. O nosso Zorba era mesmo um filósofo da câmara: andava fotografando vivos e mortos. Tem um ensaio sobre o Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro, e outro sobre o secular Cemitério Senhor da Boa Sentença, na Paraíba.
Ele vem todos os verões, fiel como as andorinhas. Agora mesmo Zorba está em Praia Formosa, no antigo chalé da família de Basinha, os Peregrinos. Uma casa de alto astral, sente-se só de entrar. Mesmo tombados, os chalés de Formosa estão desaparecendo diante da erosão imobiliária. Restam apenas alguns, e os que Zorba recolheu na sua máquina fotográfica. Ontem foi fotografar o Engenho Trapuá, onde José Lins do Rego viveu sua infância, palco do imortal “Menino de Engenho”.
O momento é propício para Antonio Augusto Zorba fotografar a Fortaleza de Santa Catarina restaurada. Primeiro foram os portugueses, que a construíram; depois os holandeses, que a tomaram e ampliaram; em pós os brasileiros, que a recuperaram. Agora, o internacional Zorba a resgatou definitivamente no preto e branco de sua luz.
*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras e da Academia de Letras e Artes do Nordeste.