qui
11
set
2014

Sitônio PintoOtávio Sitônio

Os brasileiros levam a sério esta história de dizer que o Brasil não é um país sério. Ontem fui surpreendido com a notícia de que a estrutura de serviços – como chamá-la? – da Copa do Mundo ainda não foi desmontada, tá todo mundo “trabalhando” como se o certame continuasse e o sete a um prosseguisse.

Essa foi pior de que o mensalão ou a compra de Pasadena. Quando estudei Español (com um nativo muito chato), a pronúncia de palavras como “Pasadena” tinha o “e” fechado, o som de um circunflexo em cima da letra, e o “n” a seguir não nasalava a palavra. Mas os brasileiros, colonos culturais dos EUA, pronunciam a palavra de origem mexicana com o sotaque dos gringos: “Pasadina”. Isso é mais grave de que a roubalheira que dizem ter existido na compra da refinaria.

A mesma coisa se faz com a palavra “mídia”. Os ianques escrevem “media”, mas na fala deles o “e” tem o som de “i”. Escrevem corretamente, como em latim, o nominativo plural de “medium”, precedido pelo artigo que não tem gênero nem número: “the media”. O colono brasileiro, quando vê o termo sem “s” e terminado em “a”, com um artigo polivalente, pensa que se trata de um feminino singular, e assim lasca o nosso artigo determinativo. Pior: aportuguesa a grafia. Enquanto os vaqueiros de Marlboro escrevem “media”, os colonos escrevem “mídia” – como o caubói pronuncia.

O colono faz isso desnecessariamente, pois em português existe há séculos a expressão “meio”, simples tradução de “medium”. O gringo escreve como no latim, mas seu imitador grafa como o cara-pálida pronuncia, pois é mais realista de que o rei. E haja “mídia” pra lá e pra cá. É assim que os meios se referem a eles mesmos e enchem a boca com o chicletes de Pasadena. Lá tem logo duas Pasadenas, uma na costa do Pacífico e outra na costa do Atlântico, mas ambas no sul, pois estão no espaço tomado ao México. Quando o Brasil vai comprar a outra? O que é que tem lá de valor, para se superfaturar?

Voltando à Copa do Mundo: o jogo terminou e o poder público não notou. As equipes do governo, encarregadas de organizar e executar o sete a um, permanecem no campo. Parece que estão esperando uma prorrogação para a seleção brasileira reverter o placar escancarado. Mas o juiz da Fifa apitou, não tem jeito. O jogo terminou mesmo.

O que não terminou, não tem fim, é a safadeza entranhada na cultura brasileira. Eu pensava que o futebol e o bicho, assim como o tráfico, eram levados a sério no Brasil. Mas qual o quê. Os barnabés da Copa continuam nos seus empregos, o paletó no espaldar da cadeira esperando o dono para assinar o ponto no fim do expediente.

Quando morre um soldado ianque na guerra, a família recebe o soldo até o dia do óbito; depois disso tchau e bênção. É assim que o governo de lá consegue reduzir a despesa da guerra. Quando o juiz apita e levanta o braço, decretando o fim da guerra, acaba-se o emprego: o ex combatente volta para o exército de reserva, batalhando a vida nos porões das fábricas.

Aqui no Brasil é diferente. Conheci uma filha de um ex combatente da guerra do Paraguai que recebia a pensão deixada pelo pai. Quem está certo? O Brasil ou Marlboro? Será que os descendentes dos pracinhas que lutaram na Segunda Guerra Mundial estão recebendo a pensão? Penso como brasileiro, o Brasil está certo. A guerra é uma viagem medonha e terrível, todo prêmio é pouco para quem volta ou não volta da terra de ninguém. Mas a Copa de 50 terminou, dois a um, a de 14 também, um a sete. Os barnabés do jogo merecem um bom chuveiro, antes da eleição.

*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras e da Academia de Letras e Artes do Nordeste.


  Compartilhe por aí: Comente

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *



Ir para a home do site
© TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. É PROIBIDA A REPRODUÇAO PARCIAL OU TOTAL DESTE SITE SEM PRÉVIA AUTORIZAÇAO.
Desenvolvido por HotFix.com.br