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03
out
2013

Sitônio Pinto*

“A tragédia foi gravada no celular de uma testemunha do crime, que teve a iniciativa e sangue frio para documentar a cena.”

Há meses que a família de José de Almeida Neto saiu da Paraíba e foi morar noutro estado, depois que seu pai foi assassinado por elementos da PM. O crime se deu na localidade conhecida por Cajá, às margens da BR 230, no município de Caldas Brandão, a cerca de 40 km da Capital da Paraíba. A vítima estava dentro do seu estabelecimento comercial – uma lanchonete na beira da estrada – de onde foi retirado pelos PMs, algemado e colocado numa viatura. Em seguida, foi pistolado com cinco tiros disparados pelos policiais. Os PMs alegaram que o comerciante tentou usar a metralhadora da guarnição, que se encontrava dentro do carro.

A tragédia foi gravada no celular de uma testemunha do crime, que teve a iniciativa e sangue frio para documentar a cena. José de Almeida não havia praticado nenhum delito, apenas interviu no diálogo entre seu irmão (a vítima) e os PMs. O irmão de José de Almeida havia chegado ao local pilotando uma motocicleta e estava sem capacete, o que provocou a ação dos policiais – que nem da Companhia de Trânsito eram. Almeida falou em defesa do irmão e, por isso, foi algemado e jogado no banco traseiro da viatura, onde foi executado. Almeida foi conduzido pelos PMs ao hospital, onde chegou morto.

À polícia civil, que abriu inquérito sobre o caso, os PMs disseram que prenderam Almeida por desacato e resistência – a mesma desculpa de sempre quando a polícia prende um cidadão. Essa hipótese de resistência é difícil de se aceitar, pois um cidadão, diante de três ou quatro policiais armados, não vai resistir à prisão. Ainda mais se considerando a condição física dos policiais, selecionados entre homens fortes e jovens, com noções de lutas marciais justamente para imobilizar quem lhes resista. Mas ninguém resiste à polícia, só um intoxicado – subalimentado, fácil de ser dominado.

A família de José Almeida sentiu-se insegura e mudou-se para outra unidade da federação, e não revela a ninguém o seu destino. Até hoje, o crime permanece impune. Além da truculência desnecessária e do abuso de autoridade que resultou na prisão de Almeida, os policiais algemaram a vítima com as mãos para a frente e jogaram-na no banco traseiro, onde estaria a metralhadora – que requer as duas mãos livres para ser operada, e não é qualquer civil que conhece o seu funcionamento. O filme gravado pela testemunha só registra cinco disparos de revólver, efetuados cadencialmente pelos policiais. Um deles confessou a autoria de dois disparos.

O crime se deu no domingo de 25 de novembro de 2012, e até hoje os apontados não foram punidos. Depois que se criou a figura de desacato e resistência, as polícias ficaram com licença para matar – como o agente 007, o popular James Bond. Por isso, transita no parlamento uma reforma nessa lei que confere ao policial o superpoder de escolher quem vai continuar vivo ou morrer. Em alguns estados brasileiros, havia – ou ainda há – uma gratificação salarial por operação considerada violenta, como a do Cajá. O policial, em vez de ser punido, ganha uma produtividade acrescentada ao soldo. Essa foi uma das sequelas da ditadura militar que garroteou o Brasil por mais de vinte anos.

Esses procedimentos violentos são mais praticados pela polícia fardada, o que tem servido de argumento aos que pretendem a desmilitarização da polícia. Dessa forma, todo o efetivo policial passaria a ser civil – o que traria um benefício maior à população, pois o policial paisano é mais eficiente de que o fardado, pelo simples fato de não ser identificado pelo marginal diante de sua aproximação. A farda, com o uso ostensivo de armas, estabelece uma situação de falsa superioridade do PM sobre o cidadão, e cria forte espírito de corpo entre os milicianos. Acrescente-se a isso o fato do cidadão – pai do estado – ter sido desarmado pelo Estatuto do Desarmamento, diante de um estado cada vez mais poderoso, imune às próprias leis, avesso ao estado de direito.

*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras, da Academia de Letras e Artes do Nordeste.


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2 respostas para “O crime do Cajá”

  1. Ricardo disse:

    fICO INDIGNADO com casos de abusos policiais como esses que acontecem no ineterior do nordeste que na maioria das vezes não são solucionados, são esquecidos como se não representassem nada, o video é um absurdo e não teve grande repercussão, encontrei-o por acaso, pesquisando por abusos cometidos por policiais e fiquei indignado com o que vi. Não tinha como o cara pegar a arma com as maos algemadas e a corregedoria nem sequer investigou, não puniu, não fez nada!

  2. PULIÇA disse:

    POVO SUBDESENVOLVIDO, PULIÇA IDEM. POVO ANARFA, PULIÇA IDEM. POVO INCIVILIZADO, PULIÇA IDEM. OU TÃO QUERENDO POLICIA INGLESA (QUE MATA TAMBEM) PARA CONTROLAR ABORÍGENES? NA EPOCA DOS MILICOS, OS QUE MATAVAM E TORTURAVAM TINHAM ESTRELAS E DIPLOMAS. O POVO MAIS EVOLUIDO CULTURAMENTE DA EUROPA, OS ALEMÃES, FIZERAM CHURRASCO DE MILHÕES. STALIN, CAMBODJA, BOSNIA ETC MATARAM HUMANOS COMO FORMIGAS. CULPADO? DEUS, QUE EXPULSOU DOIS IDIOTAS QUE RESOLVERAM COMER A “FRUITA” QUE “ELE” COLOCOU LÁ PRA TENTAR OS COITADOS. RESUMINDO, MESTRE SITÔNIO: VÁ REZAR MUITO, IMPLORAR AO CRIADOR PARA QUE RETORNE A HUMANIDADE AO ESTADO ANIMALESCO DE ONDE VIEMOS. VAMOS SÓ MATAR PARA COMER. NÃO PERCA TEMPO IMPLORANDO A NÓS MESMOS PARA CONTRARIAR NOSSA NATUREZA MAIS PROFUNDA DE ASSASSINOS POTENCIAIS.

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