Laudo por hora

“A PM estava inquieta, queria saber quem foi, como foi.”

Sitônio Pinto*

A perícia do caso da família de PMs assassinada em São Paulo foi apressada. Em duas horas, os legistas apontaram a solução da tragédia: o pré-adolescente matou os pais, a tia e a avó, depois se matou com um tiro de pistola semiautomática 40. Nenhuma perícia criminal poderia ser tão eficiente, expedindo um laudo sobre a morte violenta de cinco pessoas, em apenas duas horas. A perícia foi mais rápida de que os assassinos, ou o assassino.

Não estou duvidando da perícia. Estou apenas questionando a rapidez da solução de caso tão grave e, talvez, complexo. Lembro-me do que aprendi numa agência de propaganda onde fui redator. Um colega mais velho recomendou-me a não levar o texto para os cartolas assim que o concluísse, pois eles mandariam redigi-lo outra vez. “Guarda o texto e leva mais tarde, ou amanhã; diz que está trabalhando no anúncio” – disse o colega veterano.

Mesmo que tivesse matado (sem trocadilho) a charada, os peritos de São Paulo deviam ter botado o laudo na gaveta e ter dito que estavam procurando (ou esperando) mais provas, maiores e menores detalhes. E ficasse mesmo esperando, ou reexaminando as evidências que possuía. Mas os peritos tiveram pressa. Será que foram pressionados para dar uma resposta? A PM estava inquieta, queria saber quem foi, como foi. E o laudo saiu como um café expresso.

Outra mais: sepultaram os corpos muito depressa. Os cadáveres resultados de homicídios não deviam ser sepultados rapidamente. Deviam ir para a geladeira e lá ficar até que não houvesse mais dúvidas sobre suas mortes. Estou muito distante da tragédia da família Pesseguini, de São Paulo, para emitir qualquer opinião; mas, em tese, entendo que houve pressa – na perícia e no sepultamento. Duas horas é o tempo de uma aula de Medicina Legal. Pouco tempo para se periciar cinco cadáveres.

Há um detalhe que a imprensa ainda não comentou: o conjunto geométrico formado pelo braço do pseudo-suicida, mais o comprimento da pistola, mais a altura do cone de esfumaçamento (a figura formada pela área da pele esfumaçada, servindo como base de um cone que tem por vértice a boca do cano da arma que disparou contra a vítima ou o suicida), ou a tatuagem, quando a marca na pele é formada por resíduos da pólvora queimada.

O pré-adolescente era de reduzida estatura, e seu braço era pequeno, compatível com seu tamanho – o que dificultaria o acionamento do gatilho com o cano da arma afastado 10 centímetros do ouvido. Isso não é um detalhe, mas um componente importante que não se pode descartar na análise da tragédia. Foi um fato como esse que derribou por terra a tese suicidista do assassinato do deputado Raymundo Asfora, ocorrido uma semana antes de sua posse como vice-governador da Paraíba.

A trajetória do projétil que vitimou Marcelo definirá a posição da arma no momento do disparo. Esse fator não foi relatado pela imprensa. No entanto, deve constar do laudo pericial. Muito se tem falado sobre a capacidade do pré-adolescente segurar uma pistola 40 no momento do disparo, mas é possível. O recuo da arma não é dos maiores; sua munição foi projetada para substituir a de 10 mm, que tinha forte coice. Ponto quarenta refere-se a centésimos de polegada, e corresponde a 10 mm.

Assim, os calibres – ou diâmetros internos do cano – são os mesmos. O que é diferente nessas munições é a quantidade de pólvora, maior no estojo de 10 mm. Um rapazinho de 13 anos tem condições de segurar e disparar uma ponto 40 após o tiro, o que não faz diferença; um de 12 anos talvez já não possa. Mas dificilmente poderão disparar a pistola com o cano a 10 cm do ouvido.

*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta, publicitário e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, da Academia Paraibana de Letras, da Academia de Letras e Artes do Nordeste.

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