Ela parou de nomear ministros para evitar comparações com os 40 de Ali Babá”.

Sitônio Pinto*

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) emprestou a mincharia de quatro bilhões de reais à Rede Globo de Televisão para cobrir o rombo das finanças da emissora. O déficite estaria no setor de TV por assinatura. Quer dizer: a TV aberta parece que não dá prejuízo, apesar de ser aparentemente de graça, mas não é – pois a publicidade, paga pelo consumismo do espectador, é quem banca o prejuízo ou lucro da empresa.

Para receber o adjutório do Governo, a Globo registrou a TV por canal como uma empresa de tecnologia. A TV por canal vem dando prejuízo mesmo nos Estados Unidos. E o assinante paga até programas religiosos, principalmente daquelas seitas que prometem, além da salvação eterna, curas, lucros e sucesso profissional aos crentes que derem uma comissão a Jesus.

Esse tal de Jesus deve estar muito rico, pois, além de ser dono do mundo, recebe a participação de dez por cento em tudo que seus crentes ganham, compram ou vende. Assim: se o fulano ganhar dez salários mínimos, tem de pagar um salário a Jesus; se comprar um carro com esse dinheiro já descontado, tem de pagar mais dez a Jesus; quando vendê-lo, paga outros dez. É um dízimo em cascata, que o otário paga para Jesus dar mais. Entrementes, o crente-contribuinte pode dar uma contribuição espontânea, em dinheiro ou qualquer coisa que valha alguma coisa, como vales transportes, relógios, alianças de casamento etc.

Depois, o crente-contribuinte pode fazer como a Globo: repassar essa despesa para sua clientela, qualquer que seja o seu ramo, com a consciência tranquila de que não está explorando ninguém – pois o beneficiário final será Jesus, intermediado pela sua igreja e seu ministro. Jesus tem muitos ministros, mais que os 39 de Dona Dilma. Ela parou de nomear ministros para evitar comparações com os 40 de Ali Babá.

Voltando aos irmãos contribuintes: eles dão dez por cento a Jesus muitas vezes, dez por cima de dez, numa contribuição em cascata – como se diz em direito tributário. Por isso, tudo que se compra ao crente-contribuinte é mais caro do que o preço da praça. Pode conferir. É mesmo que comprar aos árabes e aos turcos.

Prefiro comprar aos ateus, que não dão comissão a Jesus, só ao Estado. Pagam ao Brasil a maior carga tributária do mundo, mas ainda sai menor que o preço do crente-contribuinte, pois Jesus perdoa pecados, mas não a dívida do dízimo. É como a cobrança da TV por assinatura: o espectador paga, mesmo que não tenha visto o filme ou o culto da igreja, que vai todo dia para o ar.

No caso da TV por assinatura, o espectador paga muitas vezes, como a contribuição do crente: paga a assinatura, paga a propaganda que é obrigado a ver, e paga o empréstimo do BNDES. As empresas de telecomunicação brasileiras devem 10 bilhões de reais ao BNDES, e o governo prefere não receber – para que a Globo e suas congêneres fiquem de rabo preso com o partido de plantão que gerencie o Estado brasileiro.

Dez bilhões são um bocado de dinheiro. Dá pra fazer sete estádios monumentais para a Copa do Mundo ou uma rede se escolas, outra de hospitais, remendar estradas, plantar trilhos de trem, ampliar presídios, cadeias e penitenciárias. Mas o governo prefere bancar o prejuízo das empresas de comunicação. É o preço do silêncio e do elogio fácil, da mentira global.

*Jornalista, escritor, poeta, ensaísta e publicitário